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Comentário do Bordiga sobre o curso histórico do capitalismo


No meio de várias loucuras, o Bordiga sempre conseguiu fazer algumas observações importantes sobre as questões estratégicas do movimento comunista. Traduzi esse trechinho da conferência A Reversão da Práxis porque ele contesta o declinismo que se tornou dominante entre os leninistas e até além deles (por exemplo, o Meszáros). Traduzi daqui

Quadros I e II - A Sucessão das Formas de Produção
Quadro I - Esquema da falsa teoria da "curva descendente" do desenvolvimento histórico do capitalismo


Comentário ao Quadro I

1. Perante o atual estado confuso da ideologia, da organização e da ação revolucionárias, é um falso remédio contar com um declínio inevitável e progressivo do capitalismo, um processo alegadamente já em curso, e no fim do qual a revolução proletária supostamente está à espera. De facto, a curva do capitalismo não tem nenhum ramo descendente (Sumário, 1).

4. A teoria da curva descendente do capitalismo é totalmente errada e gera a questão inadequada de saber por que razão, se o capitalismo está em declínio, a revolução não está a avançar. A teoria da curva descendente representa o desenvolvimento histórico como uma sinusoide: cada regime, por exemplo, o regime burguês, começa com uma fase ascendente, atinge um ápice, depois começa a declinar até um mínimo; em seguida, outro regime começa a sua ascensão. Esta visão é a do reformismo gradualista: sem solavancos, choques ou saltos (Relatório, 4).

A afirmação frequente de que o capitalismo está no seu ramo descendente e não poderá voltar a subir contém dois erros: um fatalista e outro gradualista.

O primeiro erro consiste na ilusão de que, quando o capitalismo completar a sua descida, o socialismo surgirá por si próprio, sem convulsões, lutas e confrontos armados; sem preparação partidária.

O segundo erro, expresso pelo facto de a direção do movimento ser ligeiramente curva, equivale a admitir que há elementos do socialismo que podem penetrar gradualmente no tecido do capitalismo.

Quadro II - Interpretação esquemática da alternância dos regimes de classe no marxismo revolucionário


Comentário ao quadro II

A visão marxista pode ser representada (por uma questão de clareza e simplicidade) como uma série de curvas contínuas que ascendem a picos (pontos singulares ou cúspides em geometria) seguidos de descidas súbitas, quase verticais; após o que, a partir de baixo, surge um novo regime social, outro ramo historicamente ascendente (Relatório, 5).

Marx não previa um crescimento do capitalismo, seguido de um declínio, mas antes o aumento dialético simultâneo da massa de forças produtivas que o capitalismo controla e da sua acumulação e concentração ilimitadas, ocorrendo ao mesmo tempo que a reação antagônica das forças dominadas, ou seja, a classe proletária. O potencial produtivo e económico geral aumenta até que o equilíbrio é perturbado e ocorre uma fase explosiva e revolucionária; então, no decurso de um período extremamente curto e intenso, as velhas formas de produção colapsam e as forças de produção declinam, abrindo caminho para um novo arranjo e para um novo e mais poderoso surgimento.

De acordo com esta visão - a única que pode ser considerada verdadeiramente marxista - todos os fenómenos da atual fase imperialista, desde há mais de um século, foram completamente previsíveis: na economia - trusts, monopólios, planeamento estatal, nacionalização; na política - regimes policiais rigorosos, superpotências militares, etc. (Relatório, 6).

Não menos clara é a posição que sustenta que o partido proletário não deve contrariar esta situação moderna com exigências gradualistas e propostas para a recuperação e renascimento de formas liberais e tolerantes.

O erro contrário do movimento proletário, e particularmente da Terceira Internacional, residiu na sua incapacidade de confrontar adequadamente o enorme poder do capitalismo com uma tensão revolucionária comparável.

A explicação deste segundo colapso do movimento de classe, ainda pior do que o social-patriotismo de 1914, conduz às difíceis questões da relação entre os impulsos económicos e a luta revolucionária, entre as massas e o partido que as deve dirigir (Relatório, 7).

Diferença entre as duas concepções

A diferença entre as duas concepções representadas nos Quadros I e II exprime-se, em linguagem de agrimensor, da seguinte forma: no primeiro gráfico, ou gráfico dos oportunistas (revisionistas de tipo Bernstein, emuladores de Stálin, intelectuais revolucionários pseudo-marxistas), há uma curva contínua que em cada ponto "permite uma tangente", isto é, procede por variações imperceptíveis de intensidade e direção. O segundo gráfico, no qual se tentou fazer uma representação simplificada da tão depreciada "teoria das catástrofes", mostra que dentro de cada período existem pontos, ou como são conhecidos em geometria: "cúspides" ou "pontos singulares". Nesses pontos, a continuidade geométrica, e portanto a gradualidade histórica, desaparece, a curva não só "não tem tangente", mas ao mesmo tempo "permite todas as tangentes" - como na famosa semana que Lenine se recusou a deixar escapar entre os dedos.

Devemos salientar que a direção geralmente ascendente do segundo gráfico se refere ao facto histórico de que, ao longo das grandes crises históricas revolucionárias, tem havido um aumento contínuo da massa material das forças produtivas; a intenção não é apoiar visões idealistas de progresso humano infinito.



Comentários

rodrigodoo disse…
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