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O Acampamento das Mulheres pela Paz de Greenham Common

Abraço da Base

Eu queria falar brevemente de um processo de lutas que foi completamente apagado da história oficial. Durou dezenove anos, e um dos seus picos foi a maior ação de massas só de mulheres que já houve no Reino Unido, além de ter sido provavelmente uma das ações de massas mais radicalizadas que o feminismo e o movimento antiguerra fizeram em todos os tempos. Mais ainda (e esse é o motivo do Acampamento ter sido apagado), foi uma ação planejada e dirigida por feministas radicais.

Eu fiquei sabendo sobre o acampamento lendo esse texto da Terry Conway, socialista feminista inglesa. Existe esse site aqui, mas a maior fonte mesmo foi o artigo da Wikipédia, que faz uma cobertura meio jornalística do processo.

Pra resumir a história, em setembro de 1981, a base da RAF (Real Força Aérea britânica) de Greeham Common (na cidade de Berkshire, Inglaterra) passou a abrigar silos para 96 mísseis nucleares americanos.

Um grupo galês chamado Mulheres pela Vida na Terra acampou na mesma época em frente à base. Era uma ação direta não-violenta inspirada no feminismo radical e ecofeminismo. Um dos lemas era "Tire os brinquedos dos meninos", e o discurso delas é que, no papel de mães, as mulheres teriam que entrar no mundo masculino do militarismo para garantir um futuro para os seus filhos e para toda a vida na Terra. A influência aqui é claramente a Mary Daly, com a sua conceituação do patriarcado como uma sadossociedade necrofílica, que teria que ser destruída pela biofilia da sororidade. Esse negócio das "mães" parece uma coisa essencialista, mas, sei lá, eu acho que tinha a ver com o simbolismo do protesto e tem um traço disso no ecofeminismo (pelo menos, é a minha impressão).

O feminismo da época também se refletia na estrutura do acampamento: nove áreas de acampamento, nos portões da base. Cada portão tinha uma "cor", sendo que no Azul e no Violeta  aconteciam rituais religiosos (o movimento de espiritualidade feminista era muito forte no começo dos anos 1980), e o Verde era uma área exclusiva para mulheres.

Algumas atividades do Acampamento eram mistas, com homens e mulheres, e muitas ações-chave eram feitas só por mulheres, tanto para romper com a supremacia masculina na luta política e garantir o protagonismo feminino,  como para marcar o caráter simbólico da defesa da vida na Terra pelas mulheres.

Na Wikipédia tem uma cronologia dos protestos (citando as fontes):

- setembro de 1981: começo do acampamento

- 1ª de janeiro de 1982: primeira invasão da base, 44 mulheres entraram e dançaram em cima dos silos (lógico que depois foram presas)

- maio de 1982: primeiro bloqueio da base, com 250 mulheres, e 34 prisões

- dezembro de 1982: Abraço da Base, com 30 mil mulheres, a maior ação composta só por mulheres na história britânica

- 29 de setembro de 1982: primeiro despejo, mas elas voltaram poucos dias depois

- 1º de abril de 1983: uma cadeia humana de 23 km, formada por 70 mil pessoas. 200 mulheres invadiram a base vestidas de ursinhos de pelúcia (um símbolo infantil para lembrar o futuro dos seus filhos)

- 11 de dezembro de 1983: Reflita a Base, com 50 mil mulheres. Uma vigília em que as mulheres apontavam espelhos pra base, pra que eles refletissem sobre as suas ações. Houve uma tentativa de invasão da base, com centenas de presas.

- 4 de abril de 1984: segundo despejo. Elas retornaram à noite

Em 1991, com o fim da Guerra Fria, os mísseis foram retirados do campo, mas o acampamento continuou até 2000 (em protesto contra o programa nuclear britânico) quando foi construído um Memorial no lugar.

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