Terminei ontem. É lindo.
A Leslie Feinberg tinha umas posições políticas complicadas*, e isso ajudou até a enriquecer o livro, porque isso aqui é um exemplo de realismo socialista, o melhor que eu já vi, junto com Capitães de Areia. É o primeiro livro dela, mas ela raramente força a mão e não cai na tentação de dar um final feliz.
Descrição linda dos bares dos anos 60, com a cultura de butch e femme (que aqui no Brasil foi bem mais rara), o trabalho como operária e o sindicalismo, depois a crise de 73 que tem consequências pessoais pesadas. Conta a história da transição de gênero de uma forma muito honesta, inclusive a destransição, que hoje eu tenho certeza que não seria mais aceita pra publicação. A parte antes da Jess ir pra Nova Iorque é poesia pura, uma das melhores descrições da solidão que eu vi na literatura. Uma obra prima mesmo, que dá pra comparar com o Jean Genet, pra pegar outro escritor que escreveu sobre a experiência de ser homossexual.
Ela se definia como lésbica butch e transgênero, como ela diz no texto sobre os dez anos do livro, porque tinha uma concepção diferente da que hoje é a mais comum. Pra ela, transgênero era a pessoa que não era vista como se encaixando no seu gênero, ou seja, não era uma autodefinição, e sim uma definição feira pela sociedade. Hoje eu acha que ela seria chamada de transmasculino.
Antes de morrer, ela conseguiu ganhar um processo contra a editora do livro e colocou ele online e de graça, em retribuição aos povos do mundo. Então pra baixar, é só clicar aqui na imagem, que vai levar pro site dela.
* Foi do Workers' World Party (WWP) americano, que rompeu com o movimento trotskista porque foi contra a revolução húngara de 1956. Com o tempo, eles meio que passaram a esconder essa origem pra se apresentarem como um partido marxista-leninista perante outras organizações maoístas. Então é meio constrangedor ler a Leslie defendendo regimes homofóbicos como os da China e de Cuba.

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