Na parte anterior dessa série, a gente parou nas vanguardas russas, e no processo de autodissolução delas, debaixo das suas contradições, mas também no contexto da contrarrevolução stalinista.
Enquanto o stalinismo chegava ao poder na URSS, a ameaça do fascismo era cada vez mais forte na Europa Ocidental.
O nazismo condenava em bloco todo o século XX, da física quântica e a teoria da relatividade, à psicanálise, à música atonal e à "arte degenerada", nome que foi usado na exposição de 1937, onde foram expostas obras de pintores como Picasso, Van Gogh e Matisse.


Na Itália, o mesmo impulso acadêmico destruiu a arte moderna durante o regime fascista. Diferente da Alemanha, aconteceu uma cooptação de alguns modernistas, como foi o caso do Marinetti, que se tornaram artistas oficiais.
Surrealismo abstrato?
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Miró, Batata |
Em 1929, quando acontece a virada política do movimento, que se liga à Internacional Comunista (a revista muda de nome, passando de A Revolução Surrealista pra O Surrealismo a Serviço da Revolução), vários artistas rompem, entre eles o Artaud e o Miró. Ironicamente, o Salvador Dalí entrou no movimento nessa época (pra ser expulso em 1939 porque ele apoiava o Franco), e ele e o Magritte garantiram a hegemonia figurativa (que sempre foi a preferência do Breton).
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Torres García, Planos de cor com duas madeiras superpostas |
Bem, conforme o fascismo foi dominando a Europa, os artistas tiveram que ir se exilando. Antes de falar de como o abstracionismo chegou às Américas, eu tenho que mencionar o último refúgio do movimento no Velho Mundo, Paris.
Em 1929, Joaquín Torres García, que também foi quem levou o abstracionismo para a América Latina (e que também era adepto da teosofia...), como vamos ver mais à frente, formou o grupo Círculo e Quadrado, pra reunir os abstracionistas, explicitamente com o objetivo de combater o surrealismo.
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Jean e Sophie Taeuber-Arp, Escrita dos Anjos |
Em 1931, o Círculo e Quadrado se funde com o grupo Arte Concreta e se torna Abstração-Criação, mais plural e devidamente contando com todos os nossos ídolos: Kandinski, Sophie Taeuber-Arp, Mondrian, Kurt Scwitters e muitos outros. Por causa do escultor Naum Gabo, existia uma influência construtivista muito forte no grupo. Mais uma ironia, o artista que tanto lutou contra a autonomia da arte teve a sorte de meter o pé da URSS em 1928, antes de ter os mesmos problemas de saúde que o Maiakóvsky, Isaac Rubin, Bukhárin etc, provocados pelo stalinismo. E a sua concepção abstracionista o fez reencontrar o Kandisnky no mesmo grupo.
América
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Marcel Duchamp, Nu Descendo a Escada |
O modernismo nas artes plásticas americanas estava a reboque do que acontecia na Europa, e dependia de alguns artistas que cruzavam o oceano, como Man Ray e Marcel Duchamp. Em 1913, aconteceu a Exibição Internacional de Arte Moderna, em Nova Iorque, onde a pintura futurista Nu descendo a escada, n° 2, de Duchamp, causou uma crise. Mas a vanguarda novaiorquina era um tipo de apêndice da parisiense, e na década de 1920, quando Ray e Duchamp saíram dos EUA, a rotina artística antiga voltou.
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Georgia O'Keeffe, Música Azul e Verde |
Um pouco depois, o onipresente Joaquín Torres García chegou a Nova Iorque, também trazendo a sua contribuição (e depois também foi pra Paris, como já vimos). Foi a emigração que formou a massa crítica que possibilitou o desenvolvimento do abstracionismo nos EUA, com a geração anterior ao expressionismo abstrato. O marco foi a criação do grupo American Abstract Artists, em 1936, e que existe até hoje.
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Até aqui, falamos da Europa e das Américas. O abstracionismo só chega à Ásia (Japão) depois da Segunda Guerra, e na África depois da descolonização, nos anos 1960. Infelizmente, nessa época, a corrente já está em decadência, que vai ser o tema das partes finais.
Mas a próxima parte vai continuar a mostrar a internacionalização da pintura abstrata, falando sobre a América Latina em geral e o Brasil em particular.
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