Pular para o conteúdo principal

A força dos trabalhadores


Esse texto é uma reelaboração de outro, que eu escrevi no blog Sem Camundongos, que não tá mais no ar. Agora, com novas informações.

Greve geral na Índia, 2020. AFP


A classe trabalhadora em si

O peso da classe trabalhadora aumentou desde 1880. Sobre a organização sindical, a resposta é um pouco mais complexa.

Nunca houve tantos trabalhadores assalariados no mundo. Segundo a OIT, hoje existe 1,82 bilhão de assalariados numa população economicamente ativa de 3,43 bilhões. Desses, mais ou menos 750 milhões são operários industriais. Além disso, existem 208 milhões de desempregados e mais ou menos 750 milhões de pequenos proprietários rurais.

Os mais de 600 milhões de trabalhadores urbanos por conta própria, na sua grande maioria, vivem no terceiro mundo e são camelôs, pequenos comerciantes, artesãos etc, mas uma parte são profissionais liberais (“classe média”).

Vendo as informações de um artigo de 1968 do Paul Bairoch com as estimativas da população economicamente ativa em cada setor da economia mundial, podemos ter noção da transformação: 





Aqui nós temos o lento crescimento do setor industrial em escala mundial. Em 1920, indústria manufatureira, construção e transportes representavam 142 milhões de pessoas, ou seja 16,5% da população economicamente ativa. 


Aqui temos a divisão por região. No conjunto dos países em desenvolvimento em 1960, chegava a 11,2% a proporção dos trabalhadores empregados na indústria. Então, desde a década de 1960 houve um aumento da classe trabalhadora industrial, que tem oscilado durante o nosso século XXI entre 20 a 25% dependendo do ciclo econômico. 


Sindicatos 

O movimento sindical, apesar dos pesares e ao contrário do que eu pensei por muito tempo, ainda organiza a população numa escala qualitativamente maior do que qualquer outro movimento. 

Em 1921, quando teve o racha do movimento sindical, as duas alas juntas tinham 40 milhões de membros, numa população de 2 bilhões de pessoas. É proporcionalmente menos do que hoje, mas a gente tem que levar em conta de que os sindicatos praticamente só existiam na Europa e nas Américas.

A Internacional Sindical Vermelha no auge teve 17 milhões de membros, mas foi declinando durante toda a década de 1920, e perdendo espaço pra Internacional de Amsterdam, reformista.

Os sindicatos anarquistas (AIT, não confundir com a I Internacional do Marx e do Bakunin) chegaram a um auge de 1,6 milhão na Espanha em 1936. Todas as outras federações anarquistas juntam chegavam a 1 milhão. A IWW, no auge, tinha 150 mil associados.

Hoje existem duas federações sindicais mundiais. A CSI, socialdemocrata e democrata cristã, com mais ou menos 191 milhões de trabalhadores na base, e a FSM, ex-stalinista, com mais ou menos 92 milhões de trabalhadores na base. 

Não existem estatísticas com alta qualidade sobre as greves, porque é muito difícil fazer uma classificação. Por exemplo, uma onda de greves defensivas como as no Egito em 2011-2013 pode significar, contraintuitivamente, que existe uma fraqueza da classe trabalhadora, que não está conseguindo nem receber os salários em dia e tem que correr atrás do prejuízo. Por outro lado, uma greve geral de um dia vai ficar despercebida na maioria das estatísticas nacionais. Por isso, não necessariamente a redução das greves expressa um enfraquecimento da classe trabalhadora. 

Como hipótese, eu vou sugerir que tem três situações diferentes em que pode acontecer um ascenso sindical. A primeira é durante a formação da classe trabalhadora assalariada em um país, em que as greves servem pra estabelecer os direitos trabalhistas básicos. A segunda, numa situação desfavorável de inflação alta, pra recuperar o valor dos salários. E a terceira em lutas políticas defensivas ou ofensivas de massas. 


Os tempos dourados do passado 

A Internacional Comunista foi um fenômeno principalmente europeu. Em 1921, no auge, tinha 887 mil membros, em 1924, depois do fim da onda revolucionária, tinha 650 mil, e foi declinando até chegar a um mínimo de 328 em 1931, como resultado da política de “classe contra classe” (não se unir com a socialdemocracia contra o fascismo).

O PC alemão sempre foi o partido mais importante, com mais ou menos 450 mil em 1921 e 124 mil em 1930. 75% da IC estava em quatro países: Alemanha, Tchecoslováquia, Iugoslávia e França. Nesses três primeiros, no auge, os PCs organizavam, respectivamente, 1,5%, 3% e 2% da população adulta (antes de rachar, 4,5% dos alemães adultos eram filiados ao SPD). Nas eleições, eles chegavam mais ou menos a 10% dos votos. Fora desses casos, eram partidos de quadros. Os maiorzinhos eram o britânico e o italiano, o resto era tipo o PSTU.

O italiano, aliás, que entre 1921 e 1924 foi dirigido pelos comunistas de esquerda, tinha entre 40 e 50 mil membros, o mesmo tamanho do KAPD, organização comunista de esquerda que rompeu em 1921 com o KPD (PC alemão), mas o KAPD viveu em crise permanente e se desintegrou nos anos seguintes.

E tudo isso na Europa. Menos de 5% dos militantes eram de outros continentes na década de 1920. Depois do VII Congresso da IC, em 1934, os partidos se tornam reformistas, pra todos os efeitos. Além disso, começa a guerra popular na China, a maior revolução agrária da história. Então, não tem muito sentido comparar nessas condições.

Hoje em dia, os maiores partidos comunistas "oficiais" são:

CPI (M)        Índia - 900 mil filiados

CPI               Índia - 600 mil 

CPN (UML) Nepal - 600 mil

PCdoB         Brasil - 400 mil

JCP              Japão - 300 mil

SACP           África do Sul - 220 mil

PCFR           Rússia - 160 mil


Por que eu tô falando isso? Porque eu acho que a gente tem uma visão distorcida pelo saudosismo. A classe trabalhadora não era monstruosamente mais organizada cem anos atrás. O que mudou, isso sim, foi a radicalidade das alternativas. E a minha impressão é de que as possibilidades concretas de cada época é que criam esse salto na consciência, e não o contrário. Hoje, com as relações capitalistas enraizadas no mundo inteiro, as perspectivas são diferentes de quando o que estava em jogo eram os caminhos para o desenvolvimento.

Comentários