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Marxismo e Ocultismo (I)

De Eliphas Lévi a René Guenon


I.

Antes de mais nada, quero dizer que isso não é um trabalho acadêmico, então não vou seguir aqueles rituais de notas de rodapé, fontes e formatação pra parecer que o texto é "sério". Além do mais, como eu não tenho como escrever full time, e a minha ansiedade não pode esperar pelo texto ficar pronto, ele vai sendo publicado aos pedacinhos mesmo. Espero que os leitores entendam e que isso não atrapalhe ninguém de apreciar e talvez usá-lo produtivamente.

O objetivo aqui é esclarecer uma coisa que está no lado obscuro do século XIX, e ainda mais é invisível para a tradição marxista, porque escapa da linha evolutiva que parte do iluminismo. O ocultismo, eu quero argumentar, foi um outro discurso contra a modernidade capitalista, literalmente reacionário (queria voltar atrás no tempo), mas que também deu uma mordidinha nas franjas do movimento operário. Mais ainda, muita gente do movimento operário foi ocultsta e vice-versa, seguindo a estranha tradição cabalista e revolucionária do William Blake.

Logicamente, vou usar uma definição "ampla" de ocultismo, como sendo o conhecimento além do natural passado pelo menos parcialmente por sociedades secretas, porque muitas correntes com práticas semelhantes são sectárias (e nisso nada devem a uma parte dos grupos marxistas) a ponto de negar que as outras sejam da mesma espécie que elas, transformando "ocultismo" num rótulo pejorativo para os outros, sempre os outros. Esse é o caso, por exemplo, dos Tradicionalistas na linha de René Guenon.

Além disso, esse texto (artigo?) tem uma delimitação no tempo, senão acabaria virando uma "contrahistória" da modernidade, desde o Renascimento (ou desde a Idade Média?), coisa que eu não tenho a menor condição de fazer (aliás, até desse projeto modesto desse artigo eu tenho dúvidas...). Por outro lado, prolongar até o século XX iria mostrar como o ocultismo, de anticapitalista romântico (Michael Löwy) ou socialismo feudal (Marx), se tornou um pilar oculto do fascismo, não só na Alemanha nazista mas até a Nova Direita europeia (Louis Pauwels etc). Se eu conseguir, tento falar por alto sobre isso.


II.

Antes de chegar no Eliphas Levi, temos que lembrar que o legado da Maçonaria (que foi a grande sociedade secreta do século XVIII) tinha sido disperso em várias frentes, a maioria longe do ocultismo propriamente dito.

A Maçonaria (e suas ramificações, como os Iluminados da Baviera) tinha sido uma força por trás dos acontecimentos revolucionários, como a Revolução Americana e a Francesa. Já no processo na França, ela foi ultrapassada pelo radicalismo jacobino e pelo comunismo de Babeuf. Durante as lutas pela libertação nacional na Itália, ela se transformou na Carbonária, já uma seita política (de onde vieram as formas organizativas do anarquismo bakuninista - aliás, Bakunin era maçom, e também do insurreicionalismo de Malatesta, que veio do republicanismo de Mazzini).

Por outro lado, as tradições da alquimia, que já estava em decadência desde o século XVII, foram preservadas em ligação com as pesquisas sobre os documentos rosacrucianos, dentro da Maçonaria.

Quando acontecem as revoluções de 1848, e a burguesia consolida o seu poder político no continente europeu, o jovem Eliphas Lévi estava combatendo nas barricadas, mas na ala radical que exigia uma "República Social". Ele não vai participar da radicalização do republicanismo que aconteceu na Carbonária (a Liga dos Comunistas de Marx e Engels tem as suas rapizes na linhagem que vem dos Círculos Republicanos franceses de 1830), e sim do rosacrucianismo.

Aí é que começa tudo: a ala mais "espiritual" e mística da Maçonaria é que vai fornecer a ideologia para a crítica radical (porém regressiva) da sociedade burguesa criada com ajuda da mesma Maçonaria. E começa toda uma série que continua com Annie Besant e com o thelemismo e o Tradicionalismo.

Mas por que? Parece que a ala republicana estava comprometida demais, e o conteúdo "transcedental" servia como uma crítica que apontava para fora do sistema. Agora, cabe entender a viragem de Lévi para o ocultismo, e o conteúdo da sua crítica à sociedade moderna.



Comentários

Rafael Laman disse…
Gostei do Texto hein Rodrigo! Poderíamos conversar disso pessoalmente. Já tive muitos debates nestes círculos exatamente por apresentar algumas colocações bem próximas da sua. E a adoção do termo thelemismo insere você na linha do ocultismo crítico? rsrs É um termo usado com uma significado bem parecido com o que usou. Parabéns!
rodrigodoo disse…

Valeu, Laman!

Esse texto ficou só na primeira parte porque eu não consegui pesquisar o que precisava pra continuar (a segunda parte ia ser sobre o passado anarquista do Elifas Levi, se eu não me engano ele fala disso na introdução do Dogma e Ritual da Alta Magia, e ia depois falar do Papus e o Stanilas de Guaita, sobre os dois eu não sei nada, ia passar pela Teosofia - a Annie Besant era sindicalista - Ordem de Thule, Golden Dawn e ia terminar com a Wicca).

Eu queria mesmo conversar contigo sobre um assunto, ia dar uma história muito maneira.

Um abração, cara!